Adèle Exarchopoulos me impeliu a assistir Bem Vindos a Bordo, filme franco-belga de 2021, dirigido por Emmanuel Marre e Julie Lecoustre. Porém, a estrela do filme é Adèle Exarchopoulos, atriz que brilhou no excelente Azul é a Cor Mais Quente e que estrela Os Cinco Diabos, em cartaz desde o dia 30 de Março nos cinemas.
Cassandre (Exarchopoulos) é uma comissária de bordo de uma companhia aérea low cost que faz trajetos curtos entre cidades europeias. Na prática, a exibição seu do dia-a-dia tem como pano de fundo as relações de trabalho deste segmento com sua força laboral, quase sempre mal remunerada, que acumulam funções e que sofrem todo o tipo de assédio moral e até mesmo sexual. Sendo estes últimos fatos enfatizados durante passagens do filme, com atenção especial à cena da entrevista de emprego para uma companhia de táxi aéreo. Repugnante.
Em paralelo a isto, vemos a vida privada de Cassandre seguir um padrão similar de degradação ou ausência de propósito. Entre uma escala e outra o filme nos mostra a sua rotina entre curtidas no tinder, sexo esporádico, festas, consumo excessivo de álcool e de outras drogas. Mesmo com esta suposta vida agitada, o vazio dela se faz notar em diversos momentos, como por exemplo quando ela chega à Barcelona e, da porta do avião, atualiza suas redes sociais com um #welcometobarcelona. Porém, a realidade é outra: ela dispõe de pouco tempo para explorar o lugar, pois preparará o avião para o vôo seguinte.
São por estas cenas que constantemente o filme me fez remeter às obras de Zygmunt Bauman (Modernidade Líquida) e Gilles Lipovetsky (A Era do Vazio). Não é novidade que na pós-modernidade o vazio existencial permeia as interações sócio-afetivas assim como nossas relações de trabalho. Cassandre é o indivíduo que agoniza nestas novas relações líquidas.
Na segunda parte do filme entendemos os motivos que levam Cassandre a adotar este estilo de vida e profissão. Em linhas gerais e sem spoilers, ela sofre um grande trauma quando adolescente e, como uma fuga, decide viver a vida pelos ares, de cidade em cidade, e tendo como base a distante ilha de Lanzarote, território ultramarino espanhol localizado diante da costa Marroquina. A relação familiar é outro ponto relevante da trama, pois surpreendentemente se transforma ao longo do filme. É como se a obra quisesse mostrar que mesmo com a sua vida líquida, Cassandre encontra um porto seguro em sua família, na França. Esta sentença ganha força principalmente na última cena do filme onde é apresentado a nós o desfecho das escolhas de Cassandre.
Bem Vindos a Bordo está longe de ser uma crítica direta ao capitalismo, suas relações de trabalho e a pós-modernidade , isto seria uma grande pretensão. Todavia, a obra nos propõe algumas reflexões bem contundentes a respeito do tema. E de quebra, podemos nos deleitar com todo o talento e exuberância de Adèle Exarchopoulos.
Confira aqui o trailer do longa!
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